Nutrição
Se Dê Conta 2013: 53 fotos, 2 semanas e algumas mensagens
Por Maria Luiza Petty, Nutricionista
Em mais um ano, o Genta (Grupo Especializado em Nutrição e Transtornos Alimentares) conduziu a Semana de Conscientização sobre Transtornos Alimentares e Obesidade - Se Dê Conta. Desta vez, a proposta era nova: ser uma campanha interativa. Sob o tema “Questione”, integrantes e simpatizantes do Genta enviaram suas fotos questionando os rígidos padrões de beleza que imperam em nossa sociedade e as recomendações de alimentação saudável que desconsideram completamente os aspectos sensoriais, socioculturais e emocionais envolvidos neste ato.
Nas últimas semanas, a página do Genta no Facebook recebeu 59 mil visualizações e 8 mil curtidas/compartilhamentos. Neste período, muitas fotos chegaram, muitas pessoas comentaram, polemizaram e muitas dúvidas surgiram. A principal delas foi:
"Afinal, por que um grupo de nutricionistas está questionando a magreza e a 'alimentação saudável'? Será que eles estão indo contra aos princípios que aprenderam na faculdade?"
Vamos tentar esclarecer:
• Fotos de pessoas cultuando o prazer em comer
Alimentação saudável é um termo amplamente utilizado atualmente, seja por profissionais da saúde ou não. Na maioria dos casos, ela é definida de maneira simplista como algo que visa suprir as necessidades nutricionais dos indivíduos, sem deixar espaço para outras relações que envolvem o ato de comer, como a socialização, a emoção e o prazer. Nesse sentindo, alimentos gostosos tornam-se proibidos, ameaçadores e promotores de culpa.
Caro leitor, nenhum alimento por si só é capaz de adoecer ou curar. Se nos alimentássemos apenas de maçã - o ícone da nutrição - sofreríamos de inúmeras deficiências nutricionais; por outro lado, deixar de comer alimentos gostosos traz diminuição na qualidade de vida (Polivy & Herman, 2005) e pode promover o consumo exagerado e compulsivo (Herman & Polivy, 1985; Massey & Hill, 2012), como elucidado várias vezes neste blog em outros posts (veja aqui, aqui, aqui e aqui).
Ao tratar os alimentos como “do bem” e “do mal”, “saudáveis” e “engordativos”, “permitidos” e “proibidos”, vamos contra a nossa essência como espécie (como apresentado em outros posts, veja aqui e aqui) e, tentar seguir as recomendações “saudáveis” - como muitas pessoas já vivenciaram - torna-se algo insustentável. Portanto, incentivar a exclusão desses alimentos da vida das pessoas NÃO contribui para que elas comam de maneira mais saudável e favorece o surgimento de vários efeitos indesejáveis, como os citados acima e claramente exemplificados por leitores que comentaram as fotos publicadas, dizendo ter medo de comer certos alimentos. Comer com prazer não significa comer exageradamente e comer de maneira saudável não significa excluir o prazer da alimentação.
O nosso objetivo é incentivar que a alimentação seja fonte de nutrientes, de relações e de prazer. Todas as funções cumprindo seu papel na proporção e momento certo. Sem substituir, nem excluir a outra.
• Fotos de pessoas questionando a magreza como sinônimo de saúde e beleza
Ser magro. O que isso significa nos dias de hoje? Infelizmente, muito mais do que apenas uma característica física. Ser magro significa ser belo, bem-sucedido, controlado e saudável. E o oposto, seguindo esta mentalidade, só pode ser descrito pelos seus antônimos: feio, malsucedido, descontrolado e doente. Isso é mesmo verdade? NÃO, estas afirmações não são verdadeiras, entretanto elas estão no subconsciente dos indivíduos que vivem na nossa sociedade e apresentam uma série de repercussões negativas.
Como apresentado em outros posts (veja aqui, aqui e aqui), a insatisfação corporal não é exclusividade de pessoas com excesso de peso e está associada a comportamento de riscos para transtornos alimentares e práticas de controle de peso não saudáveis, além de diminuição do bem-estar psicológico (Haley et al., 2010; Neumark-Steiner et al., 2009).
Caro leitor, o peso não é um indicativo de saúde. Uma pessoa magra não necessariamente se alimenta bem, se exercita ou tem bem estar emocional, por exemplo. Por outro lado, se o obeso tem todas essas características citadas acima, de nada valem porque seu “peso está excessivo”. Mas, se uma pessoa tem excesso de peso e emagrece seguindo a dieta da sopa, ela passa a ser vista como alguém que está mais saudável e é parabenizada inclusive por profissionais da saúde. Portanto, queríamos deixar claro que somos contra as premissas de que vale tudo para ser magro e de que peso tem a ver com saúde ou hábitos de vida saudável. E caso o leitor se pergunte se a obesidade deve ser sempre combatida, pois traz inúmeros efeitos prejudiciais à saúde, um estudo recente (Wildman et al., 2008) nos mostra que 51,3% dos adultos com sobrepeso (aprox. 35,9 milhões de pessoas) e 31,7% dos obesos (aprox. 35,9 milhões de adultos) eram metabolicamente saudáveis.
Ao contrário do que muitos acreditam, sentir-se confortável com o seu corpo, independente de sua forma e tamanho, aumenta o bem-estar - o que por si só já representa mais qualidade de vida - e favorece o autocuidado. Pesquisa realizada com 1013 mulheres obesas, por exemplo, mostrou que aquelas que internalizavam estereótipos de pessoas obesas como preguiçoso, descuidado, etc., apresentavam maior frequência de compulsão alimentar e se engajavam MENOS em tratamentos para emagrecer (Puhl & Schwartz, 2007).
Portanto, promover a aceitação e satisfação corporal é promover a saúde.
Referências:
• Haley CC, Hedberg K, Leman RF. Disordered eating and unhealthy weight loss practices: which adolescents are at highest risk? J Adolesc Health. 2010 Jul;47(1):102-5.
• Herman CP & Polivy J. Dieting and Binging - A Causal Analysis. American Psychological Association 1985, 40(2): 193-201.
• Massey A, Hill AJ. Dieting and food craving. A descriptive, quasi-prospective study. Appetite 2012, 58: 781–785
• Polivy J & Herman CP, 2005. An evolutionary perspective on dieting. Appetite 2006,47:30–35.
• Puhl RM, Moss-Racusin CA, Schwartz MB, Brownell KD. Weight stigmatization and bias reduction: perspectives of overweight and obese adults. Health Educ Res.2008;23(2):347-58.
• Scagliusi FB, Pereira PR, Stelmo IC, Unsain RF, Martins PA, Sato PM. Insatisfação corporal, prática de dietas e comportamentos de risco para transtornos alimentares em mães residentes em Santos. J Bras Psiquiatr. 2012;61(3):159-67.
• Wildman RP, Muntner P, Reynolds K, McGinn AP, Rajpathak S, Wylie-Rosett J, Sowers MR. The obese without cardiometabolic risk factor clustering and the normal weight with cardiometabolic risk factor clustering: prevalence and correlates of 2 phenotypes among the US population (NHANES 1999-2004). Arch Intern Med. 2008, 11; 168(15):1617-24.
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